sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Matuto Conta História


Como se pudera se apropriar da linguagem, o matuto faz da língua um tela para suas criações. O Matuto conhece tão bem aquilo que está em suas mãos, que se permite brincar com seu instrumento de trabalho. Existe um certo dialogismo entre a lógica do matuto e a concepção comunicativa. Só esse ser consegue arbitrar a dinâmica onde todos estão inseridos

Quando o matuto ousa se pronunciar, ele já conhece tão bem cada um de seus expectadores, que nem chega a fazer grande esforço para provocar nestes a sensação esperada. O Matuto observa. Enquanto cidadãos do mundo degladiam-se em resgatar numa história rotineira o maior número possível de significantes contidos no repertório de quem os ouve, o matuto escuta.

Ao contar uma história, o ser Matuto traz à tona bens simbólicos que criam, nas projeções hiper-realistas de todos os seus ouvintes, alter-egos aventureiros, desbravadores, sábios e mansos, um arquétipo surge nesse momento. Quando um matuto fala, ele tem a preferência. É possível que no meio de uma história, alguém faça assim por dizer um adendo, mas no momento em que o matuto retoma as rédeas da história, todos se calam.

O matuto nunca deixa uma historia pela metade, ele sempre sabe. Só ele pode se dar ao luxo de ser desacreditado no meio de sua jornada explanatória sem nunca, no entanto, ser creditado como mentiroso. Não há dúvidas, que em alguma curva da Caatinga que só ele conhece tão bem, a verossimilhança aparecerá novamente diante dos ouvidos daqueles que não apenas o ouvem, mas degustam o sabor do doce de Jaca mole, da sirigüela, do Melão-do-mato ou enxergam a criança tingida em cima da Jaboticabeira.

Não que não seja mérito dele, é sim, é máxima culpa do Matuto ser tão encantador, mas não deixa de ser absoluta verdade o fato de que, ainda que não fosse tão digno de admiração, seria respeitado e adorado pelo contexto em que se encontra.

Reside, no seu discurso o charme nostálgico de uma época de outrora à qual se entregam aqueles que nunca conheceram tal prazer, Quando o Matuto fala, então, ele permeia um universo que não pertence mais a ele, uma vez que ele sabe que só meninos de prédio ficam tão embasbacados, e não pertence aos meninos, porque é a conotação que os fazem sorrir, é a imaginação, acima de tudo, intrínseca em todas as imagens criadas em suas vãs memórias, que os fazem sonhar uma viagem tão simples e bela.

Existe então, digamos assim, um limbo, uma zona de acesso, onde o único a ter acesso é o ato comunicativo em si. No momento em que o matuto fala e os outros ouvem, é neste exato lugar onde todos se encontram, como se fora um Marco Zero. O matuto prestes a voltar a sua pseudo-encantadora-realidade; os outros as suas não-tão-encantadoras realidades.

Com a ousadia que me é permitida, o poeta é mesmo um fingidor, Pessoa.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

(so)


azul, rosa, lilás. ela tentava se concentrar nas cores do lençol, tentava se lembrar da visão que tivera de seu quarto segundos atrás de apagar as luzes, era inútil.

o medo superou sua razão, tanto quanto o frio arrepiante transpassava a colcha retalhada por sua vó. os móveis rangiam mais do que o de costume, e Maria Flor não sabia se era suficientemente corajosa para levantar e acender a luz, ainda q por poucos instantes, só pra tranquilizar o miocárdio...

da janela de seu quarto, no meio da madrugada, uma estrela se destacava. não piscava, simplesmente, pulsava. Maria Flor nunca quis tanto entender o código Morse quanto naquele momento. ela tinha certeza de que alguma tentativa de comunicação estava em curso alí, apesar de ser incapaz de decodificar a mensagem

trouxe o lençol aos olhos, numa atitude infantil de se proteger do perigo. a fonte de luz pulsante, que agora já não parecia vinda de uma estrela tornava-se uma bola maior de mistério a cada pulsão, e aproximava-se dela numa velocidade quase agressiva.

Chegou tão perto de sua janela, que iluminava seu quarto como se fora meio-dia, Ela levantou-se. não hesitou, qualquer que fosse a natueza daquele estranho contato, ela sabia ser incapaz de controlá-lo.

Quando finalmente chegou na janela, sua curiosidade não permitia-lhe calcular o risco. esticou em direção ao desconhecido seus tímidos dedinhos, como quem esperasse tê-los arrancados de forma súbita.

Não havia mais luz alugma, questionou-se a escuridão por poucos segundos, antes de ser surpreendida por um zumbido ensurdecedor que invadiu seus ouvidos, rasgando seu tímpano de tal maneira que, quando o silêncio se fez, Maria Flor pensou estar surda. havia mais do que bucolismo naquele silêncio.

Era o barulho do nada.

Maria Flor viu o objeto acender-se novamente e pulsar de volta para seu lugar no céu com os olhos deslumbrados de um adolescente que vê a primeira mulher nua da vida

Foi até o outro lado de seu quarto e acendeu as luzes, voltou à janela e viu uma pedra. forma indefinida, parecia empoeirada. ela limpou até enxergar seu brilho, branco como os ossos de um humano.

(ela merece continuação, mas o estado n me permite)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Caetano + Warhol




... E foste um difícil começo. Afasto o que não conheço. E quem vende outro sonho feliz de cidade. Aprende depressa a chamar-te de realidade. Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso. Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas. Da força da grana que ergue e destrói coisas belas. Da feia fumaça que sobe, apagando as estrelas...


/casinha (nah)



Se a luz branca, que vem do sol, é uma composição que contem, dentro de si, todas as frequências num espectro que temos como 'visível aos olhos humanos' , se fôssemos capazes de ir até um outro sistema, que não o solar , e ficásemos expostos a uma outra luz, mais completa do que a lz branca, proveniente de uma estrela que queimasse outros gases, numa atmosfera diferente, e tivesse outras frequencias luminosas sendo expelidas, seriam nossos olhos capazes de perceber cores totalmente novas?



segunda-feira, 31 de agosto de 2009

/casinha (nah)








E quando tocava a musica, parecia que sim, havia varios padrões diferentes de compassos sendo executados simultaneamente por timbres diversos mas, inacreditavalmente, eu era capaz de percebê-los separadamente e isolá-los aumentando ou diminuindo seu volume, pra perceber sua relação com os demais timbres, que seguiam compassos diferentes.

Eis que de repente surge uma moto perto de mim, - aquele típico som de motor se encaixava perfeitamente no penúltimo timbre mais grave da música e fez desaparecer, completamente, este som por alguns segundos- e quando, por bem, ela resolve desligar-se, inteompendo portanto, o barulho por ela espalhado, o som do instrumento cujo timbre acompanhava perfeitamente o compasso da moto, esvai-se junto com o ruído dela.

A música fica assim agora, incompleta, e 'auditoralmente' diferente, me espanta que naquele momento eu olho pra todos os brothers da roda, e ninguém dá a mínima, me surpreende a hipótese dos outros terem sido incapazes de perceber a latente diferença. Quando finalmente decido tirar meus fones de ouvido para entender sobre o que eles conversavam e assim, possivemelnte, desculpá-los pela imensa falta de perspicácia, me dou conta que era deles que a musica estava saindo o tempo todo

''Que merda, então eles não tavam ouvido essa porra dessa musica, não estavam deliciando-se com essa descoberta?'' é, merda véi. ngm, a menos eu, terá o prazer de lembrar desse bode.



quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

enchamos o copo!



o amor é copo de cerveja.

de nada adianta bebê-lo todo de uma vez. sem degustar, sem apreciar seus gostos, sem curtir o momento em que te delicias com ele

aqueles que buscam um entorpecente, apaixonam-se, ou embebedam-se, sem nunca conhecerem a pureza do amor

de nada vale também deixar o copo no centro da mesa como se sua importância fosse mostrar aos outros o que vc tem

não é expondo o teu amado que será mais forte ou menos mentiroso o teu amor

tens de mantê-lo perto de si ...interagir com ele. e que seja de verdade

a cerveja é amarga sim, mas não tanto quanto o amor. por isso, consuma-os qdo te julgares pronto. não ouças ninguém

só proves se quiseres de verdade. ou no final de tudo, se arrependerás de teres começado

não deixes que a tua falta de atenção te impeça de encher o copo sempre que necessario

há de se tomar o amor antes que já não valha mais a pena tomá-lo ...antes que todo o gás que o mantinha atraente...escape sem q percebas

não deixes que teu amor fique velho, sem frescor, abandonado, ele não se renova sozinho

enchas o copo.



sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O Causo do seu Dagoberto






Vô te contá um causo
Cê pode num creditar
mas se passou em coremas
uma cidade bem longe da capitá

seu Dagoberto era um cabra muito bom
muito honesto e trabaiadô
mas tinha um pobrema
uma frô de muié que só lhe dava dô

dona Maria Rosa
esposa de seu Dagoberto
tinha fama de fogosa
e num tinha marido esperto

mesmo com suas qualidadi
era de dar dó
sua muié não lhe dava valô
e ainda era chamado de bocó

depois de muito tempo
vivendo aquela situação
seu Dagoberto se arretô
e tomô uma decisão

-nessa casa não vivo mais
não sou burro de carga não
num joguei pedra na cruiz
pra sofrê tanta humilhação

quando ouviu isso
dona Maria Rosa pensô
"tenho de arrumar um jeito
de segurar o meu amô"

no mesmo dia sem demora
dona Maria Rosa procurou sua vó
que era famosa por seus consêio
que não deixavam ninguém no caritó

-Ô vó! me ajuda por favô
a sigurar meu homi
que não me deixa passar fômi
e só faz me dar amô

- Minha neta não se desespere
que todo causo tem solução
e vou lhe dá um bom consêio
num se chora por homi não

- Vó, o causo foi o seguinte
seu Joaquim, dono da padaria
sempre que passava por mim, surria
e isso se repetia todo dia

então um belo dia
me tratou com desfrute
- Dona Maria, muié arretada,
namora comigo depois dessa cantada

na hora me assustei
num creditei no que ôvi
mai logo me avexei
e disse sim pra seu Joaquim

- Minha neta, escute bem
isso num foi direito não
mas agora a desgraça já se feiz
se ajoêie e peça perdão

isso eu ja tentei
mai de nada adiantô
Dagoberto é cabeça-dura
e cum isso ele cismô

- Então só tem um jeito
dessa história se acabá
passe naquele terreiro
lá perto do arraiá

dona Maria Rosa
correu logo pro terreiro
procurou um macumbeiro
e macumbaram cum um bezerro

mas a macumba que fez lá
num era da bôa não
seu Dagoberto ficou estranho
e começou a ter transformação

toda noite de lua chêa
tava feita a confusão
começava a nascê pêlo
parecia um bichão

atacava todo mundo
ninguém com ele podia
se de noite ele saía
só se ôvia gritaria

dona Maria Rosa
foi procurá um bispo
pra tirar do seu hômi
aquele bicho mardito

o bispo tentou de tudo
mas nada deu jeito não
e ele foi se cansando
de tentar achar a solução

depois de muito pertubar
o povo daquela cidade
o lobisômem foi simbora
sem deixar muita sardadi

menos pra Maria Rosa
que ainda tinha em seu coração
a imagem de seu dagoberto
sem ser aquela aberração